sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Funcionário de hospital diz que PMs mandaram não atender jovens feridos

Um funcionário do Hospital Geral Roberto Santos, para onde foram levados os dois jovens que foram mortos durante uma operação da Polícia Militar, ocorrida no bairro de Saramandaia, em Salvador, no dia 30 de julho, disse que viu o momento em que os policiais deixaram as vítimas no local.

Segundo ele, que prefere ocultar a identidade, os policiais chegaram com os dois rapazes e pediram para que os funcionários da unidade hospitalar não prestarem atendimento. “Disseram que era para deixar lá, que era pombo, que era bicho, que era envolvido, que era traficante, que não era para dar socorro, não”, afirma.

A testemunha informa que ouviu quando os policiais comentaram sobre outras duas pessoas. Segundo os moradores, duas outras vítimas estão desaparecidas desde o dia da operação policial no bairro. “Foi feita a pergunta por um terceiro policial, que chegou no local para perguntar se só foram eles dois [as vítimas]. Ele [outro PM] falou não, que teria tido mais e que estariam na outra guarnição”, relata o homem.

Jaciene da Conceição, mãe de um dos jovens, afirma que o seu filho não era envolvido com o tráfico, como relata a corporação sobre o motivo da operação. “Ele não era nenhum vagabundo. Ele estudava”, diz.

O coronel da Polícia Militar, Nivaldo Nascimento, ressalta que os 16 policiais que participaram da ação foram afastados das ruas e vão fazer serviços administrativos até que as operações sejam concluídas. “Assim como a população quer justiça, a Polícia Militar quer mais que todos porque é o nome da corporação que está em jogo”, afirma o coronel.

Familiares dos jovens mortos em Saramandaia, em Salvador, se reuniram na manhã desta quinta-feira (2) com o sub-comandante geral da PM, Coronel Carlos Eleutério. De acordo com o chefe de comunicação da PM, capitão Carlos Pita, o encontro teve o objetivo de contextualizar os parentes sobre o que a PM vem fazendo em relação as ações da polícia no atentado contra os jovens. O capitão disse que o Ministério Público será convidado a participar do processo de apuração para que não aconteça corporativismo com relação aos PM's envolvidos.

O capitão Pita disse ao G1 que durante a reunião, a PM contextualizou as famílias sobre a sindicância que polícia está realizando e o afastamento dos policiais. A polícia informou ainda que as armas dos envolvidos foram recolhidas. A PM informou ainda aos familiares que o comando determinou urgência para a finalização do processo.

Afastamento
A decisão pelo afastamento dos 16 policiais que participaram da operação ocorreu após os moradores de Saramandaia se manifestaram pela segunda vez na Avenida ACM, bloqueando o trânsito na região na tarde de quarta-feira (1º). Na terça-feira (31), o local também foi palco de protestos. Na ocasião, a polícia afirmou que duas pessoas morreram no bairro durante troca de tiros entre suspeitos de tráfico de drogas e homens do grupo especial Rondesp e da 1ª Companhia Independente da Polícia Militar.
Segundo a polícia, a equipe teria ido ao local averiguar a denúncia da realização de uma "festa do pó", quando foi recebida a tiros por 15 homens armados que participavam do evento. Houve confronto e os dois baleados foram levados para o Hospital Geral Roberto Santos, mas não resistiram aos ferimentos.

Relato de testemunhas
Os dois jovens de 14 e 19 anos mortos na noite de segunda-feira (30) foram enterrados na manhã de quarta-feira (1º), no Cemitério Quinta dos Lázaros, de acordo com a avó de uma das vítimas, que prefere não se identificar.

Na casa de uma das vítimas, a mãe Jaciane Conceição vive a dor e revolta pela morte violenta. "É um sofrimento, né. Como mãe, a gente nunca quer perder um filho da maneira que perdeu", lamenta. "Eu espero a Justiça, meu filho não era vagabundo, não era traficante, não andava com envolvimento com ninguém para fazerem uma besteira dessa com meu filho, tirar a vida do meu filho", desabafa a mãe.

Uma moradora de Saramandaia, que não quis se identificar, diz ter assistido à morte dos dois jovens. "Já chegaram atirando. Teve um que se ajoelhou aos pés do policial e pediu pelo amor de Deus, que não era para matar. O policial foi e matou", diz.

Segundo os moradores, o crime teria ocorrido em um campo de futebol onde estavam cerca de 30 pessoas, que participavam ou assistiam a um jogo. Testemunhas contam que era por volta das 21h policiais desligaram a luz dos refletores e entraram atirando. Uma cápsula de pistola foi localizada no campo na terça-feira. "Ele deu um tiro no barro lá, mas não pegou em minha perna, não. Depois ele deu um tipo para cima para eu parar, eu não parei", afirma um jovem, que estava no local, mas também não quer ser identificado. Moradores afirmam que outros dois outros jovens estão desaparecidos desde a ocasião do crime.
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